No sábado, dia 21 de maio, aconteceu em
Aparecida do Norte, o 6º Simpósio Nacional das Famílias. Vamos acompanhar as
principais conferências e testemunhos deste dia de formação e partilha.
A VIDA NASCENTE PEDE MISERICÓRDIA, com
Padre Hélio Luciano
Vamos começar nosso encontro falando sobre
a defesa da vida. Primeiro, uma provocação. Na vida eterna com Cristo, teremos
corpo material ou seremos apenas espírito? No Credo, rezamos: Creio na
ressurreição da carne... então... teremos corpo, sim. Muita gente não tem
consciência disso. É necessário termos boa formação. Qual a nossa missão como
Pastoral Familiar na defesa da vida? Existem pessoas morrendo e pessoas
morrendo por falta de atenção nossa. Existem mulheres sofrendo o drama do
aborto por falta de atenção nossa também. As mulheres que abortam sabem que
esse é um gesto horrível, mas no meio do seu desespero, ela pode não encontrar
ninguém que a mostre uma outra solução.
Estamos no ano da Misericórdia. Apenas
sentimos pena ou nos mobilizamos, doamos a vida para tirar o irmão das suas
misérias¿ a miséria do outro deve estar no meu coração e eu devo me sentir
responsável por ele. Num nível bem mais elevado, recordamos Deus que é a mais
pura misericórdia. Por mérito próprio, não merecemos nada. Não mereceríamos nem
ter sido criados. Mas Deus quer dividir tudo o que é e que possui conosco, por
amor. Não conseguiremos ser perfeitos como Ele, mas somos convocados a darmos o
nosso melhor.
Não adianta acusar. Esta é a atitude de
Deus e não de Cristo. E a atitude do cristão deve ser a de entrar no problema
da pessoa, sofrer com ela e resgata-la.
Sabemos que existem pessoas e organizações
nacionais e internacionais empenhadíssimas em legalizar o aborto no Brasil.
Superdimensionam os problemas para tentar convencer autoridades e a sociedade.
Mas do outro lado, os defensores da vida caem no mesmo erro, muitas e muitas
vezes. Um exemplo disso é, por exemplo, usar fotos de bebes abortados para
chocar os outros. Ora, são fotos de seres humanos mortos. Não temos o direito
de manipula-los.
Uma vertente deve ser a defesa macro da
vida, acompanhando as leis que cuidam da vida e da família. Uma estratégia
muito comum é dizer que o aborto é um problema de saúde publica, alegando que
200 mil mulheres morrem por ano em decorrência de abortos clandestinos. Esses
dados são absurdamente falsos. O DATA SUS por exemplo divulgou no ano de 2010
que 66 mil mulheres em idade fértil morreram das mais diversas causas.
Vejam as manipulações sentimentais como no
caso da mulher que sofre por saber que esta gravida de um filho deficiente.
Ora, deve, então, sofrer duplamente por ainda carregar a culpa de ger matado
seu próprio filho¿ a anencefalia, por exemplo, é uma deficiência que pode ser
evitada com ingestão de ácido fólico no período pre Natal.
Não nos preocupa a opinião pública. O que
nos interessa são as pessoas reais. O bebe não nascido, a mulher que sofre... o
que temos feito Lara ajudar de forma concreta as pessoas concretas¿
Em poucas ocasiões na sua vida pública
Jesus estava com as multidões. Ele queria o contato um a um, pessoa a pessoa.
Exemplos clássicos são o encontro de Jesus com a Samaritana ou a adúltera que
estava para ser apedrejado, ou com Zaqueu... O nível macro é importante, mas
não podemos esquecer das pessoas reais e concretas. Conversar com elas, nos
interessarmos por sua vida e seu sofrimento. Ainda que tivéssemos leis
perfeitas para o aborto, isso não evitaria que pessoas abortassem e nem que
sofressem profundamente com isso, as vezes para a vida toda.
Não sejamos ingénuos no nível macro, mas
também não sejamos insensíveis no nível de cada pessoa humana. Não há machismo
maior que o aborto, porque só quem se livra nessa situação é o homem. A criança
para com a própria vida e a mulher sofrerá com a dor de ter mantado o próprio
filho.
A defesa da vida envolve tempo, energias,
dinheiro. Ou ficamos apenas no nível superficial da compaixão ou entramos
profundo na verdadeira misericórdia.
Já há filósofos e sociólogos estudando o
fenômeno bipolaridade ideológica especialmente nas redes sociais em que pessoas
só se agridem. Essa não é uma boa estratégia. Devemos sair daqui hoje com um
projeto concreto de ajuda às mulheres que pensam em abortar ou abortaram.
O AMOR NA FAMÍLIA, com Dom João Bosco
A culminância do caminho sinodal e dos muitos
caminhos que envolvem a família no mundo estão resumidos na exortação Amoris
Laetitia. Há pouco mais de um mês a conhecemos, portanto, sempre há algo novo a
descobrir, lendo e relendo o documento. É pouco tempo não só para conhecer mas
para colocar em pratica toda essa riqueza. Como o próprio papa pede para evitar
interpretações superficiais ou errôneas. Se isso acontece, uns aplaudem e
outros criticam e acabamos vivendo esse ódio de lados opostos que o padre
Luciano mencionou, por quem pensa diferente de mim.
O documento é grande pela extensão e
grandioso por sua proposta realmente inovadora, que é a cara do papa Francisco.
Sem fazer mudança na doutrina da Igreja e nem mesmo em praticas pastorais, tem
feito muitas mudanças, especialmente no modo do mundo ver a Igreja. O texto vem
carregado da sua alegria, falando de modo positivo, esperançoso e
misericordioso do amor de Deus derramado nas famílias.
Na Evangelii Gaudium, o papa já alertava
que não fosse um documento para ir para gaveta, mas um programa de vida e de
pastoral. A Amoris Laetitia vem neste mesmo sentido. Para compreender seu
conteúdo melhor o papa enviou previamente um bilhete aos bispos, pedindo que,
para aproveita-lo melhor relessem antes a Gaudium et spes do Concílio Vaticano
II, a Humanae Vitae, a Familiaris Consortio. Sem que nenhuma dessas fontes seja
ultrapassada ou substituída, a Amoris Laetitia vem para enriquecer e atualizar
a ação misericordiosa da Igreja sobre a família atual. Cuidado com a mídia que
distorce tantos fatos. Com seu jeito, papa Francisco consegue sabotar a imagem
caricaturada que a mídia que fazer da Igreja.
Não é um documento de chegada, mas de
partida, da Igreja em saída. Responde abrindo horizontes e não fechando, sem
normativas, mas pedindo delicadeza e discernimento e sobretudo uma visão
positiva da família, redescobrindo a alegria do amor.
Mas não podemos ver isto de forma
simplória. Se consideramos que Deus é amor e que tudo na nossa vida depende do
amor, é necessário conhecer muito do amor verdadeiro.
Vou mencionar apenas dez pontos. É pouco
mas deve nos instigar a irmos a fonte. O papa parte de Palavra de Deus, do
salmo 127 numa linda exegese, indo depois para o Gênesis com sua beleza e seus
dramas. Fala também de I Cor 13, esmiuçando cada característica do amor.
1- Caridade conjugal
2- O
amor é um caminhar que deve olhar sempre para o futuro. Não nasce perfeito, mas
pode ir crescendo com um apoiando o outro.
3-
Amizade na família – depois de Deus nossa família é o nosso maior amor,
incluindo respeito, sexualidade, paixão, intimidade, ternura, estabilidade,
reciprocidade... amor que precisa ser cultivado a cada dia.
4- Amor conjugal que é de exclusividade
indissolúvel – quem ama de fato encara o desafio do amor ser eterno
5- A alegria é a marca do amor – não pode
ser obsessiva e nem ligada a determinadas coisas, mas a vida familiar como um
todo. Combina satisfação e fadiga, tensão e repouso, aborrecimentos e prazeres.
Cultivar a verdadeira beleza, dos olhos que veem com amor, que vê a grandeza de
um ser humano que está diante de mim e me leva a buscar o seu bem, mais até do
que o meu próprio. Daí vem as verdadeiras alegrias.
6- O casamento não só um papel assinado,
nem uma cerimônia. Mas mostra a seriedade da identificação com o outro, mostra
publicamente a maturidade, que está disposto a crescer. O matrimônio tem um
papel social da missão do amor na sociedade. É tão importante que vale a pena
assumir o risco e, por isso, mesmo deve ser bem ponderado, mas sem ser adiado
indefinidamente.
7- O capítulo sobre o diálogo é muito lindo
no documento. Daria por si só um livro. Como é preciso saber usar bem essa
ferramenta fundamental. Precisa ser sempre exercitado, especialmente neste
mundo tão turbulento em que vivemos.
8- A sexualidade e as emoções precisam ser
bem aprendidas e vividas. O papa recorda que e a Igreja sempre foi criticada
por sufocar as paixões, por proibir e condenar. Deus ama a alegria dos seus
filhos. Nesta parte, recorda seu antecessor, Bento XVI, na Deus Caritas Est. O
que prejudica não é o prazer, mas quando o prazer se torna um Deus e faz com
que eu veja as pessoas como objetos. Se forem orientadas sempre para um projeto
de autodoação, virá a felicidade plena.
9- A vida está cada vez mais longa graças
ao avanço das tecnologias e da qualidade de vida. É preciso esforço redobrado
para manter o amor por muitos e muitos anos. É um ícone da fidelidade de Deus
que dura toda a eternidade. Mesmo que o corpo e a mente feneçam o amor pode ser
cultivado.
10- Espiritualidade familiar que tem sua
fonte no mistério da Trindade. Na unicidade e diversidade da família é que se
encontra a imagem mais perfeita de Deus.
Viver a cada dia este amor concreto e real
é a missão de cada família.
O AMOR NA FAMÍLIA: CAP. IV e VIII, com Dom
Wilson
O Papa não trouxe nenhuma mudança radical
com a exortação pos sinodal. Mas, ao mesmo tempo ele procurou não deixar nada
de fora deste documento. Além disso, os temas abordados dizem respeito à
realidade das famílias. Pastoralmente, sua preocupação se manteve na forma de
agir e ajudar às famílias, abordando questões do dia a dia e de
espiritualidade.
Para lermos o documento, o Papa aponta
alguns princípios:
1)
A inclusão. Ninguém deve ficar
de fora. TODOS devem estar inseridos.
2)
A Misericordia, que também
devemos aprender a vivenciar.
3)
A Gradualidade. Não se trata de
enfraquecer a norma, mas de ir adquirindo-a aos poucos.
4)
A alegria que já foi mencionada
na reflexão anterior
5)
O cuidado com o outro, o que,
na vida familiar, é fundamental
6)
Discernimento. As palavras
chaves da Amoris Laetitia são discernir, acompanhar e integrar. Em muitas
situações é preciso discernir caso a caso.
7)
Norma e situação concreta. É preciso
haver uma interpretação e nem sempre a norma pode ser o primeiro princípio, mas
sim a caridade
8)
Evitar a rigidez, mas também
não cair no relativismo. É preciso buscar o equilíbrio.
9)
Colegialidade. O papa quis a
opinião da Igreja toda e sempre quer convocar os bispos para conversarem
juntos. Esse princípio é bem claro.
10)
Conversão pessoal e pastoral
11)
Via Caritatis, ou seja, o
caminho da caridade.
12)
Ética sexual diante de tudo o
que se induz no mundo de hoje
13)
Valorização do subjetivo,
respeitar a forma como a pessoa entende a norma, ainda que precise ser
corrigida e orientada. O caminho novo pode começar a partir daí.
14)
A misericórdia excede a
justiça.
O documento dá
forma externa ao foro interno. Este último pode ser o ponto de partida de um
processo de conversão. Vale aprofundar a questão da caridade anteceder a norma,
olhar a lei natural também como critério.
É preciso pensar
no tempo, no processo, na situação em que cada pessoa se encontra. E quando
falamos de espaço, nos referimos a domínios de situações.
O documento trás
varias situações de São Tomás de Aquino, que define muito bem os sentimentos e
analisa o ser humano profundamente.
O documento explica
que nem todos os que estão numa segunda união estão necessariamente em pecado,
pois é preciso avaliar a vida matrimonial de cada casal.
Nos n. 250 e 251
o documento é bem claro ao afirmar que as pessoas com tendências homossexuais
devem ser respeitadas e acolhidas, e que não há como se comparar à união do
homem e da mulher.
Reafirma a
doutrina sobre o mal intrínseco da contracepção, e fala da ajuda aos casos dos
matrimônios mistos e das famílias monoparentais.
No capítulo VIII
vemos as sugestões pastorais para as pessoas feridas pelo divórcio e que estão
em uma segunda união.
Não julgar nem
aplicar diretamente a norma, acolher, acompanhar, incluir. Buscar na vida das
próprias pessoas os elementos que favorecem seu crescimento espiritual. Receber
o que há de bom em uma vida aparentemente toda irregular. Perceber situações
culturais que podem influenciar os casais também.
O papa fala que a
igreja tem duas lógicas. Uma é a de marginalizar o pecador e fazer julgamentos
negativos, separando certas pessoas. Ou podemos ter a lógica da inclusão,
chegando até a pessoa ferida e trazendo-a para perto, para cuidar dela. Esse é
o caminho que devemos sempre trilhar. O caminho da misericórdia.
A nossa ajuda é
exatamente a de auxiliar a própria pessoa ferida a reencontrar seu caminho na
igreja. Que ninguém seja condenado para sempre. Aqui entre o discernimento. Que
não se trata absolutamente de abrir exceções ao bel prazer. Há critérios
importante, sem dúvida, como o de não causar escândalo a comunidade, por
exemplo. A lógica da integração é a chave do discernimento pastoral e de se
conhecer situações atenuantes.
Deve-se, ainda,
estimular todos os casais a que sejam bons exemplos para os jovens, mesmo entre
os casais em uma segunda união.
Sabemos de todas
as dificuldades mas não devemos propor nada menos do que um ideal pleno. Não
existem famílias perfeitas, mas existe um modelo perfeito de família. Não
podemos ser simplesmente uma pastoral de administração de fracassos, mas de
promoção de famílias cristãs fortes para que essas situações de sofrimento
possam ir diminuindo cada vez mais. Esse tipo de testemunho é fundamental para
os jovens.
Não imponhamos
condições á misericórdia, que não exclui nem a justiça, nem a verdade. Devemos
sempre ter a esperança de que a pessoa pode mudar, pode melhorar. Trilhemos
este caminho na nossa forma de fazer Pastoral Familiar.
Na parte da tarde, a programação teve, ainda, diversos testemunhos de iniciativas frutíferas em favor da defesa da vida humana. E o encerramento no sábado foi com o Santo terço, missa e procissão.
No domingo, dia 22, todas as missas do Santuário foram em intenção à união e santificação das famílias.